sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Truz Truz: prendinha


Um guia-intérprete não tem como sua única função as visitas guiadas. Como somos na verdade a figura presente de todo um programa planeado durante meses, acabamos por ter contacto com todas as outras áreas: restauração, aeroporto, hotéis, actividades, polícia, hospitais... e vamos observando, aprendendo até acabarmos por executar funções que à partida não se pensa que um guia as faz.

Por exemplo: entrega de prendas nos quartos.

A maior parte das vezes são os grupos de incentivos que têm este serviço, porque a empresa quer premiar ainda mais o seu trabalhador e oferece-lhe algo que é colocado no seu quarto enquanto o grupo está em alguma actividade fora do hotel. Assim, quando a pessoa regressa, abre a porta e vê em cima da cama ou da mesinha de cabeceira uma pequena surpresa!
E foi essa a minha função neste grupo. Enquanto as minhas colegas estavam com eles nas visitas ou jantares, lá ía eu - qual agente secreta! - colocar as prendinhas nos quartos.

Recebi a lista de quartos - 118!!!! E o mapa com a distribuição por dia: que prenda entregar em cada dia. Preparei cada prenda (o tag, o embrulho) e junto com o bagageiro do hotel fui de quarto em quarto bater às portas e deixar a surpresa!
Durante essas longas horas (2 horas para preparar e 2 horas para entregar) fiquei a saber mais da vida de um bagageiro e de um hotel. Daria um outro blog certamente.

Sapatos confortáveis é o material obrigatório. Tenho pena de não ter um medidor de passos, porque certamente fizemos quilómetros naqueles corredores. Depois: força de braços! Ainda bem que não era eu sózinha a empurrar o carrinho! E encontrar soluções estratégicas para não ter que ir abastecer o carro muitas vezes e abrir o máximo de portas possível, pois só o bagageiro tinha a masterkey e a autorização para abrir as portas!
E tudo tem um ritual: nos primeiros andares não deveriamos utilizar os elevadores dos hóspedes, mas os de serviço!
Ao chegar aos pisos onde já poderiamos utilizar os elevadores dos hóspedes, caso estivesse alguém no elevador não poderiamos entrar com o carrinho e deveriamos esperar outro elevador.
Antes de entrar no quarto deveriamos tocar à campainha e depois bater na porta, só então depois entrar! Ah e prestar atenção aos avisos de Do not disturb!
O maior erro é entrar num quarto que tenha colocado - Não incomodar! Se a pessoa estiver lá dentro... parece que pode fazer mesmo uma boa reclamação. Se não, entrar e incomodar é apenas um acidente de percurso!
E se houve 2 acidentes de percurso!!! Ou 3!
1 - Lá íamos nós, vê lista, recolhe a prenda, toca a campainha, bate à porta, conversa para ajudar a passar o tempo, abre a porta e ops: quarto escuro, um casal, um corpo a saltar de cima do outro, uma voz mais alta a dizer "quem vem lá" e nós a fecharmos a porta o mais depressa possível e a pedir desculpa! Aiiiii
2 - O mesmo ritual, abre-se a porta e... um homem nu passa da porta da casa de banho para o quarto, o bagagero fechou a porta o mais depressa possível, eu fugi da porta principal para que o senhor não fica-se embaraçado ao ver uma mulher e mais uma vez um pedido de desculpas aceite! Não tinhamos mesmo culpa. Sem avisos na porta, sem respostas, pensando que estão todos no tour, fazemos a função que nos pediram!!! Aiiii (dizia o bagageiro depois "nu até ao pescoço menina!!!eheheheh)
3 - Tudo se repete, silêncio total, entro pelo quarto. Este era um dos maiores, ou seja, a cama não se via logo da entrada. Quando aproximo-me quase gritei: a senhora dormia profundamente. Mas mesmo profundamente. Deixei a prendinha na mesma!

E nessas horas ouvi as histórias de bagageiros, empregadas de limpeza, empregados dos bares, porteiros, tudo vidas cheias de vidas! Realmente em cada profissão arranjamos as nossas defesas, truques e passamos por momentos difíceis e momentos de alegria.

Confesso que fiquei com uma noção maior da quantidade de pessoas que podem entrar no nosso quarto de hotel e que realmente podemos confiar, mas que também devemos proteger-nos se tivermos connosco objectos importantes.
Confesso que diverti-me, mas que a ideia de entrar num espaço onde a outra pessoa não sabe que tal iria acontecer é estranho. Entrar num quarto que não me "pertence", cheio de objectos que não são meus para deixar algo é quase como invasão de privacidade. Acreditem que vemos coisas que não queriamos ver!!!
(pior teria sido se as prendas entregues fossem roupa! Dividir tamanhos é o mais difícil, sobretudo porque nunca chegam nas quantidades certas e temos que inventar desculpas para deixar um M em vez de um S imaginando que a pessoa conhece alguém maior a quem quer dar aquela sweat que estamos a deixar!)

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